De casa para o trabalho, do trabalho para casa.
Duas vezes por dia cada percurso.
Todos os dias.
Há meses.
Só os horários é que mudam.
É muito tempo percorrendo os mesmos nove quarteirões. Já sei a que horas abre a maioria das lojas, já decorei quais calçadas são as melhores para a caminhada, já descobri em quais esquinas é melhor para atravessar a rua. Dou bom-dia para o passeador de cachorros, para o pai de um vizinho com quem tive um caso há muitos anos (o vizinho, não o pai, bien entendu), para os motoristas do ponto de táxi. E porque de tempos em tempos eu sonho com um buldogue que se chamará Nero Wolfe, fico reparando nos cachorros que saem para passear sempre nos mesmos horários.
Uma vez vi um perdigueiro marrom com manchas brancas que levava a dona no trote por quarteirões seguidos. O bicho pulava, corria, cão de caça mesmo, daqueles que não deixa passar nem uma folha seca rolando. Achei graça no jeito com que a moça se esforçava para acompanhar o passo do cachorro. Eles passaram e continuei meu caminho. Depois disso, passei a encontrá-los com certa regularidade e até descobri onde moram. Numa manhã, os vi saindo de um prédio baixo na esquina de onde fica a agência onde trabalho.
Dias depois vi outra mulher passeando com o perdigueiro marrom e branco. Achei estranho, mas imaginei que fosse a mãe da primeira moça. Quando a encontrei pela segunda vez e pude reparar melhor, vi que era jovem demais para ter uma filha daquela idade e fiquei intrigada. Qual seria a relação entre as duas? Concluí que o mais provável é que dividissem a mesma moradia e o mesmo bicho de estimação. Podiam ser namoradas, quem sabe.
Foi quando vi a segunda mulher sair de um prédio antigo e luxuoso que fica no meio do quarteirão, pouco antes da agência. Com o cachorro. Foi aí que não entendi mais nada. Minha teoria estava furada. Elas não dividiam um apartamento, não moravam juntas, talvez não fossem namoradas. Mas, então, o quê? Matutei um pouco, analisei as opções e... ah, lógico. Elas ERAM namoradas, mas se separaram e agora dividem a custódia do cachorro. Só podia ser isso, óbvio. Continuei meu caminho satisfetia, com a minha mente literária e ficcional até o último neurônio feliz com o desfecho lógico que eu tinha encontrado para aquele mistério.
Ontem, percebi que as coisas são bem mais simples e óbvias do que sonha a minha cabeça de contadora de histórias. Eu caminhava para casa na hora do almoço e ao dobrar a primeira esquina encontrei as duas mulheres. Com DOIS cachorros! E foi exatamente isso que eu falei, em voz alta e incrédula, quando as vi: "São dois cachorros!" As duas me olharam, deram risada e, quando o semáforo ficou verde, cada uma de nós seguiu uma direção diferente.
Fui-me embora para casa, sorrindo sozinha e murmurando: "São dois cachorros...!"
Tão simples, né?
sexta-feira, 14 de novembro de 2008
Resposta óbvia
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quarta-feira, 8 de outubro de 2008
A nova escravidão
Eu, a menina que odeia fazer dieta, fico feliz ao ler a seção Espaço Aberto de hoje no Estadão.
Miguel Reale Jr. escreveu um artigo muito interessante sobre o significado do corpo (sim, do físico) desde Adão até os dias de hoje.
Em uma exposição de idéias lindamente encadeadas, ele começa e a glorificação do corpo, considerado pela Bíblia o bem maior, a única coisa que retomaremos no momento da segunda vinda de Cristo. Por isso, segundo o artigo, a forma de controle mais utilizada na Idade Média, por exemplo, as punições e as restrições mais comuns, envolvem castigos físicos e privações do corpo.
Não vivemos mais em feudos medievais. Já passou o tempo em que o corpo das pessoas e sua força física eram escravizados em nome da produção comercial. A filosofia paz-e-amor dos anos 1960 veio para libertar mente e corpo, para dar às mulheres total domínio sobre o seu físico.
No entanto, como bem aponta o artigo, nem sempre as mulheres sabem o que fazer com essa liberdade. E nesse ponto reproduzo as palavras de Miguel Reale Jr.:
"Engano. A exterioridade prevalece, na atenção angustiada ao corpo. Há nova forma de escravidão. Tornam-se escravos do corpo, que escraviza ao ser endeusado como escultura a reproduzir os modelos construídos por celebridades: um desespero a cada grama a mais denunciado pela balança.
(...)
Garotas sem tempo para ler, para exercitar a imaginação e a fantasia, para se entreter com filmes, com brincadeiras e conversas, dedicadas exclusivamente à ginástica autocentrada em frente ao espelho."
E o articulista encerra magistralmente, refletindo-se em suas palavras tudo o que penso a respeito do assunto:
"A aparência predomina sobre a substância. Na nova escravidão, seqüestra-se o espírito: só existe o corpo. E se esquece que os dois, corpo e espírito, devem ser alimentados simultaneamente para uma vida significativa. A busca da beleza escultural como um fim em si mesmo produz mentes insanas, corpos sem densidade."
Falou e disse.
P.S. A inspiração deste post devo a minha querida amiga Stefanne, competentíssima mídia da agência. Não, ela não é uma dessas fanáticas por corpos esculturais, mas, sim, por cérebros em forma. Graças a ela, o jornal chega todos os dias à minha mesa.
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segunda-feira, 22 de setembro de 2008
Envelhecer é uma arte
Porque sou uma criatura de hábitos, há alguns anos criei uma rotina para o dia do meu aniversário.
Costumo acordar bem cedo, pouco depois das cinco da manhã. Tomo café com minha mãe, com bolo de chocolate e uma tacinha de champagne (eu sei, é cedo, mas é meu aniversário – o que justifica a comemoração – e é champagne – que pode e deve ser bebida a qualquer hora).
Depois, pego três livros que só são folheados uma vez por ano, no meu aniversário. O primeiro é The New Penguin Book of Love Poetry, antologia de poemas divididos por temas como intimidade, declarações, persuasão, celebrações, separações e outros. Abro o livro aleatoriamente e leio um poema qualquer, embora eu sempre retorne à página 25 para ler o soneto XLIII de Elizabeth Barrett Browning, que transcrevi em outro post.
O próximo livro é Resoluções para o novo milênio, um desses livros de auto-ajuda, com uma frase por página, todas sugerindo ações para melhorar a qualidade de vida individual e das pessoas à nossa volta. É uma ótima forma de fazer um balanço do ano que passou. Faço anotações nas páginas, indicando o ano e comentando como foi.
E, por último, o Guia das Idades, livrinho simpático que indica quem fez o quê, quando e com quantos anos. Abro na página referente à idade que completo e leio, por exemplo, que Michelangelo começou a trabalhar na Capela Sistina aos 33 anos. Com a mesma idade, Mary Wollstonecraft escreveu Direito das Mulheres e Injustiça dos Homens, até hoje um trabalho de sociologia bastante importante para quem estuda o tema Mulher. Não bastassem esses dois exemplos inspiradores, encontro mais um: George Lucas dirigiu o primeiro Star Wars com 33 anos.
33 anos. Agora que escrevo os números, que os vejo na tela do computador, é que finalmente percebo, nossa, como o tempo passa rápido. Tenho amigas que já são 10 anos mais novas que eu e um chefe que é só 10 anos mais velho. Tenho idade para ser mãe de uma estudante de ginásio. E realmente há uma que, embora não seja minha filha, me procura para obter conselhos sobre sua vida adolescente.
Hoje faço 33 anos. Envelhecer é uma arte. Tenho muita sorte de ter exemplos ótimos de como fazer isso sem enlouquecer.
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quarta-feira, 3 de setembro de 2008
Eu, eu mesma e o outro
Às vezes me pergunto como seria se todos os e-mails que recebo fossem cartas de verdade, aquelas raridades feitas de papel. Imagino que minha mesa estaria coberta de envelopes os mais diversos, os mais inúteis.
O que aconteceria se todos os anúncios que invadem diariamente minha caixa postal eletrônica fossem impressos e enviados pelo correio? Bom, em primeiro lugar, todos os carteiros seriam dublês de Schwarzenegger, Stallone, Vin Diesel ou The Rock: musculosos e com pernas compridas, requisitos essenciais para carregar a pesada sacola de correspondências e caminhar a passos largos para entregar tudo a tempo.
Neste exato minuto, tenho 173 mensagens não lidas na caixa de entrada do Outlook. Porque todas elas são newsletters de sites e blogs que acompanho, o programa permite que eu crie uma regra que as direciona para uma pasta criativamente chamada "Para ler depois". Assim, as mensagens não me incomodam e ficam guardadinhas até que eu tenha um tempinho para lê-las. Ok, já sabemos que eu tenho certa dificuldade em organizar meu tempo, mas isso é assunto para outro post.
O fato é que, além de newsletters, clippings e boletins que recebo e faça questão de ler, mesmo com atraso de semanas, recebo diariamente mensagens tão esdrúxulas que me fazem pensar se esse tal de e-mail marketing foi realmente uma boa invenção.
Se eu atendesse a todos os apelos eletrônicos que me fazem, eu seria a feliz proprietária de um apartamento financiado em 85.913 vezes, teria o melhor seguro-saúde do país, compraria uma réplica original de um relógio Tag Heuer, meus problemas de calvície acabariam com o produto que já apareceu no Globo Repórter, teria perdido 9 quilos em uma semana com uma dieta peruana revolucionária e, o melhor de todos, meu pênis ficaria enorme, com mais de 9 polegadas!
Ou seja, de acordo com o perfil das empresas que me mandam todo esse lixo eletrônico, eu sou um homem careca, gordo, que mora de aluguel e, o pior, impotente! Será que tenho um alter ego de que não tenho conhecimento?
Alô, gente fina cibernética: não está na hora de rever seus conceitos?
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sexta-feira, 25 de julho de 2008
Dia do escritor
Mas escritor tem dia? Escritor tem dia, tem hora, tem lugar? Quem escreve não escreve todos os dias? A toda hora? Em qualquer lugar?
Parafraseando Damatta, o que faz um escritor, escritor?
Não é o dia, certamente. Tem dias que é tão difícil escrever... Parece que as palavras fazem rodízio e não circulam pelo centro expandido do meu pensamento. As palavras terminadas em vogal sofrem restrições às segundas-feiras, as palavras com sufixo -mente, -eza e -dade às terças-feiras, e por aí vai.
Não é a hora, tampouco. Todas as horas incitam a escrita. O momento em que a noite já não é mais noite, mas ainda não é dia. Bem cedo, quando o sol já se levantou, mas a cidade ainda não. De manhã, vestindo pijamas, com a bandeja de café-da-manhã ao lado do computador. A caminho do trabalho, rabiscando em cadernos, blocos, agendas, livros, verso de extratos bancários, num pedaço do papel de presente que embrulhava a caixa de bombons que você ganhou no dia anterior.
Será o lugar? Também me parece que grande parte dos lugares é propícia. Sala de espera de consultório médico ou laboratório, restaurante por quilo e o Parque Ibirapuera de manhã são ótimos para se escrever crônicas. Pousadas bucólicas na montanha ou um cruzeiro, para reflexões acerca da pequenez do ser humano, tanto em tamanho quanto de espírito. Alguns lugares são mais inspiradores que outros, claro. Fila de banco ou de cartório só para, a la Kafka, transformar o funcionário em um coleóptero.
Alguns diriam que é a crítica; outros, que é o público que faz um escritor. Eu, que morro de medo de mostrar o que escrevo, claramente nunca serei escritora se isso for verdade.
Seja o que for que faz um escritor, escritor, o importante é nunca parar, não esmaecer, arrefecer jamais. Escrever sempre.
Parabéns.
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quarta-feira, 2 de julho de 2008
Reflexões na sala de espera do médico
9h50.
"Será que é possível uma pessoa feliz escrever bem, assim, boa literatura? Essa gente que não tem problema, que está feliz com o que tem, satisfeita no casamento, que tem filhos comportados, goza de boa saúde. Sobre o que uma pessoa dessas falaria? Só posso imaginar que escrevesse um daqueles romances água-com-açúcar ou belo thriller imprevisível. O primeiro, porque refletiria a vida que leva, em que as coisas estão nos eixos e há pouco espaço para surpresas. O segundo, justamente pelas razões opostas, porque seria a única forma de trazer caos para a ordem cotidiana, de acordar a pasmaceira do dia-a-dia e fazer sentir, provocar emoções, que, de outra forma, o autor não sentiria. É preciso ter algum desvio psicológico, alguma tara, obsessão, idéia fixa, algum interesse secreto, para escrever literatura? Na verdade, todos possuímos tudo isso; necessário mesmo é ter coragem de desnudar nossas fraquezas e envolvê-las em papel e letras e palavras. Acho que gente feliz não escreve porque não precisa pensar na própria vida, não se depara com dilemas, não tem de tomar decisões difíceis, tão difíceis que a cabeça fica imaginando inúmeras soluções alternativas para não encarar a realidade.
Quando eu era adolescente, escrevia muito mais, embora nem sempre com qualidade. A maioria das vezes, verdade seja dita, com nenhuma qualidade. mas eu escrevia, tinha muito mais imaginação (ou disposição) para fazer de conta, criar vidas que não eram minhas, fazer nascer relações que não me pertenciam. Hoje, é muito difícil me dissociar da minha própria vida, da minha personalidade, do meu personagem. Sinto que todo personagem que eu criar será uma versão alternativa de mim mesma, e a chance de as pessoas perceberem isso me apavira, a idéia de expor a mim e minhas psicoses, paranóias, essa realidade que só existe para mim, é aterrorizante."
10h20.
"A história da minha vida. Entro e saio de ortopedistas desde que me lembro, Meu pé esquerdo, meu joelho direito, um cotovelo que não lembro qual é, a lombar. Já tirei tanta radiografia que conseguiria juntar todas e montar uma chapa de corpo inteiro, uma versão gótica de um book de modelo e manequim. Tenho a impressão de que meus ossos não fazem parte do mesmo conjunto, como várias caixas de Lego que se misturaram: a do circo com a do cowboy com a do astronauta com a do bombeiro. Quanto tentamos encaixar o chapéu de um na cabeça de outro, até serve, mas fica capenga."
10h35.
"Alguém já reparou como as pessoas adoram parecer super-heróis? Adoram dizer que dormem tarde e acordem cedo, que não precisam de oito horas de sono, que mal tem tempo de almoçar, que vão de São Paulo a Campinas em meia hora, que já foram multados três vezes na Imigrantes, que estão prestes a perder a carta, e achando bonito tudo isso. Que o celular não pára de tocar, que trabalha 15, 16 horas por dia, que não tem tempo de ir ao cinema, que não podem se dar ao luxo de ficar doente. Tudo isso, elas dizem com uma pontinha de orgulho, já repararam?"
10h41.
"Deus me guarde e me conserve para que eu morra do coração, para que eu mantenha minhas faculdades mentais e minhas habilidades físicas até o fim."
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terça-feira, 1 de julho de 2008
Ele, de novo
Xico, ah, Xico...
A ARTE DA CANTADA PERMANENTE -O REMAKE
A cantada, amigos, é como a revolução de Mao Tse-Tung, tem que ser permanente.
Existem mulheres que a gente canta no jardim da infância para dar o primeiro beijo lá pelos treze, quatorze.
Mas é necessário que a cante sempre, não aquela cantada localizada, neoliberal e objetiva, falo do flerte, do mimo, do regador que faz florescer, como numa canção brega, todos os adjetivos desse mundo.
A cantada de resultado, aquela imediata, é uma chatice, insuportável, se eu fosse mulher reagiria com um tapa de novela mexicana, daqueles que fazem plaft!
A boa cantada é a cantada permanente.
E mais importante ainda depois que rolam as coisas, depois que acontece, aí a cantada vira devoção, oração dos pobres moços a todas elas.
Porque cantar só para uma noitada de sexo é uma pobreza dos diabos, qualquer um animal o faz.
Porque cantar, à vera, é cantar todas e não cantar nenhuma ao mesmo tempo.
Explico: é espalhar pacientemente a devoção a todas as mulheres como quem espalha sementes nos campos de lírios.
Mesmo que elas digam, com aquele riso litografado na covinha do sorriso, que você diz isso para todas.
E claro que para cada uma dizemos uma loa, fazemos uma graça, não repetimos o texto, o lirismo, o floreado.
Porque amamos mesmo as mulheres.
Cantemos indiscriminadamente, e que me perdoe o velho e bom Vinícius de Moraes, mas cantemos sobretudo as ditas feias, esse conceito cruel e abstrato de beleza. Elas merecem, até porque as feias não existem, nunca conheci nenhuma até hoje.
Não por sermos generosos, piedade, ou algo do gênero... É que a dita feia, quando bem cantada, vira a superfêmea, para lembrar a bela pornochanchada com a Vera Fischer.
A cantada permanente e indiscriminada é irresistível, quando você menos espera, acontece o que você tanto sonhava.
Sim, tem que ter o cuidado para não ser simplesmente um chato que baba diante do melhor dos espetáculos, a existência das mulheres.
Ter que cantar sempre a mesma mulher e parecer que está apenas de passagem, que o estribilho é sempre novo, nada de larararás que mais parecem refrões do Sullivan e do Massadas, lembram dessa dupla de músicas chicletosas?
Ah, digamos que você cantou a Sônia Braga ainda naqueles tempos em que Gabriela subiu com aquele vestidinho no telhado –a cena mais quente da teledramaturgia brasileira até hoje- e e continuou cantando, sempre, sutil e sempre, e agora ela, passados tantos calendários, se comove e resolve recompensá-lo! Vai ser lindo do mesmo jeito, não acha? Na tela do nosso cocoruto vai passar o videotape de todos os desejos antigos e despejados no ralo pela morena cravo & canela.
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quinta-feira, 17 de abril de 2008
Mantra para tomada de decisões
Tomar decisões é muito difícil. Todos os dias, a cada minuto, vemo-nos em situações que demandam uma atitude.
Há decisões que parecem complicadas, mas, na verdade, são simples, como decidir o que servir em um jantar em que um é macrobiótico, outro não gosta de salada e mais alguém está fazendo a dieta de South Beach. Não importa o cardápio mas, sim, a reunião de pessoas queridas e a celebração da amizade.
Vezes há que não temos coragem de tomar uma decisão e a vida (o cosmo, o além, o inominável, as fadas, os gnomos, dê o nome que quiser) resolve o impasse. Como quando você tem um emprego que não gosta, trabalhando para pessoas que despreza, ganhando um salário ofensivo, mas não tem a coragem de pedir demissão ou o ânimo de procurar novo trabalho. De repente, você é demitido e é obrigado a se virar. O que parecia um transtorno acaba se tornando uma benção, e você está livre para seguir seu caminho e procurar um emprego que realmente seja estimulante.
A decisão mais difícil, porém, é a de voltar atrás. Se bem que não existe essa de “voltar atrás”, uma vez que só é possível seguir em frente. Ainda que retornemos à uma situação anterior, ela sempre será nova, dado que nós não seremos mais os mesmos. Por exemplo, namorados que brigam e reatam, filhos arrependidos que voltam para a casa dos pais, uma refeição no restaurante de sempre, uma nova visita àquela cidade européia que tanto te encantou há cinco anos. Ou voltar a trabalhar no mesmo lugar do qual você achou que tinha se libertado, sobre o qual você jurou, em silêncio, que nunca mais.
Recentemente, um amigo muito querido teve de tomar essa decisão. Não sei os motivos que o levaram a tal, mas posso imaginar. Entendo-os todos e o apoiarei em todas as decisões que ele tomar, torcendo para que sua alma e sua inteligência não sejam maculadas, mas permaneçam afiadas, porque me são indispensáveis.
Não me atrevo a dizer seu nome, mas, querido amigo, essa música é para você. Ande de cabeça erguida, cante pelas ruas, stand tall, walk proud, nem mais, nem menos. Não desista.
This in my time
(Sasha)
If you're feelin' kind of down
And nothing really seems to work out right
Your troubles might be awfull
But don't you let you're head hang down tonight
Just remember what it feels like
To be standin at the top
come on and shout it out
This is my time
This is my life
and I'll live it the way that I want it
This is my time
Made up my mind
and it feels like I'm gonna make it
Don't think about the past
Just let your future dreams inspire you
come and get your act together
just believe in what you can really do
Just remember what it feels like
To be standin at the top
come on and shout it out
This is my time
This is my life
and I'll live it the way that I want it
This is my time
Made up my mind
and it feels like I'm gonna make it
Never give it up
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sexta-feira, 11 de abril de 2008
Conquistar sempre, perecer nunca!
Então, você fica pensando, eu vou encontrar um cara legal, vou encontrar um cara legal, um mantra entoado no momento em que você acorda e olha para o criado-mudo sem foto; quando vai tomar banho e tem uma só toalha pendurada no gancho, e até na hora de se vestir, a calcinha branca de algodão, meio amarelada, e você percebe que há tempos não compra roupa de baixo porque, simplesmente, não tem para quem mostrá-la.
Você se mantém firme nessa história de pensamento positivo. Já te falaram que é uma ferramenta poderosíssima, você acredita. Lembra-se de todos aqueles livros da lista dos mais vendidos, milhões de pessoas não podem estar erradas. Alguém te indica uma cigana, você vai e ela te diz que o que é seu está guardado. Você, no íntimo, espera que ela não esteja falando dos dólares que sua avó te deu no último aniversário e que estão escondidos junto com as calcinhas que você nunca usa. Bom, os dólares você também nunca usa, porque ainda não se animou para gastá-los em uma viagem solitária.
Seu cabeleireiro fala sobre um incenso para espantar maus espíritos. Uma amiga quer te apresentar um colega de trabalho do primo da mulher do chefe dela. Sua mãe acha que você tem de mudar de emprego; você não entende o que uma coisa tem a ver com a outra, mas como ela sempre reclamou do seu emprego, você não dá ouvidos. O garçom do bar que você freqüenta te dá a dica, olha, aquele cara ali no canto gostou de você, ele é separado, mas é gente boa, quer dizer, separado não, mas é como se fosse, a mulher dele é uma chata; você agradece e pede outra caipirinha, anotando mentalmente para deixar uma boa gorjeta, ou mudar de bar. Seus amigos já se acostumaram a te ver sozinha, mas eles são legais, gostam de você, se preocupam com o seu bem-estar, não ficam comentando sobre sua solidão pelas costas, eles até pedem para que você cuide dos filhos deles durante o fim de semana na praia, não é ótimo?
Um dia, você resolve fazer uma lista de tudo o que você gostaria que um homem fosse, tivesse, falasse, fizesse. Listas são uma mania, você não consegue se livrar delas, desde criança é fissurada em listas. Fazia listas das novelas que já assistiu, dos livros de que tinha gostado, dos atores que achava bonitos. Lembra-se dos atores e começa a escrever. Você não pede o corpo do Vin Diesel, mas pede que o seu eleito – coisa cafona, chamar de eleito, mas você ainda não consegue falar namorado, na-mo-ra-do, não por enquanto – seja um homem forte, bom caráter, seguro de si e que a respeite. Você não pede o charme do Kiefer Sutherland, mas pede que ele tenha bom humor e carisma. Você não pede a inteligência do Einstein, mas pede que ele saiba, pelo menos, quem foi Einstein. Palavra por palavra você descreve – em uma atitude meio patética, meio adolescente – um ser mitológico, um verdadeiro Ulisses e reza para que ele apareça.
Sim, reza. Para Zeus e os resto do Olimpo, que liberem um daqueles semideuses para você. Para Buda, que o seu caminho de iluminação seja à luz de velas, com champanhe, morangos e chocolate, dentro de quatro paredes. Para Shiva, que transforme a sua existência sem graça em uma vida plena, trazendo alguém a quem você possa se dedicar. E para Santo Antônio, ele mesmo, o infalível. Você faz a trezena, acende velas azuis, vai até a casa dele visitá-lo.
Três meses depois, todo o seu esforço é recompensado e seu Ulisses aparece. A luta acabou, Tróia ficou para trás. Todos aqueles fulanos em pele de cavalo que apareceram diante de seu portão se foram, restou apenas o herói.
Seis anos mais tarde, quando tudo parecia perfeito, o que você faz? Atende o telefone na hora que não poderia. E mais, não desliga na hora que deveria.
Irônico ou o quê?
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segunda-feira, 7 de abril de 2008
Não sou Momo, mas sou o senhor do tempo
Diversas vezes, durante a semana passada, pensei em passar por aqui e pedir desculpas aos frequëntadores do blog por não tê-lo atualizado diariamente, como eu estava acostumada, por falta de tempo. Mas, depois, pensei: ninguém vai acreditar nisso. Como assim, falta de tempo? Se eu conseguisse arranjar tempo para escrever um post de desculpas, melhor seria usá-lo para comentar sobre algo mais interessante.
Essa questão de tempo é uma coisa engraçada. Quantas vezes não ouvimos alguem dizer, "não faço porque não tenho tempo"? O sujeito não toma café da manhã porque sai correndo e não almoça porque tem muito trabalho. Não convida os amigos para jantar porque não tem tempo de preparar a refeição. Não vai ao cinema porque não tem tempo para ficar na fila, mas compra um carro cada vez maior e mais rápido para chegar antes nos lugares. O que esse fulano faz quando tem um tempo livre é um mistério para mim. Sim, porque até um sujeito desses tem tempo livre de vez em quando. Talvez ele arranje uma amante e se queixe a ela de que a mulher parece não ter mais tempo para ele.
Tempo, para mim, é questão de escolha. Se quero fazer um mestrado, mas trabalho das 9h às 19h e não consigo assistir às aulas, devo escolher entre o emprego e a universidade. Se não posso para de trabalhar porque tenho de pagar minhas contas, a escolha está feita e o tempo nada tem a ver com isso. Se quero fazer exercícios e o único período de que disponho é a manhã, então devo escolher entre o sono e o parque e, de novo, não se pode falar em ter tempo ou não.
Então, faltou-me inspiração? Também não, sobrou assunto. Poderia ter comentado sobre o caso Isabella Nardoni, o dossiê da Dilma, o caos no trânsito ou algum livro que li. O caso da menina, no entanto, com o tempo, será resolvido; já o caso da Dilma... acho que nem o tempo nos dirá! Problemas de tráfego existem desde tempos imemoriais e, francamente, falar sobre os livros que li talvez fosse perda de tempo para quem não é estudioso de literatura policial como eu.
E mais alguém notou como o tempo parece estar transcorrendo de forma esquista ultimamente? Estamos em abril, certo?, mas para mim parece que já faz muito mais do que quatro meses, desde que desembarquei meio macambúzia, parece que faz anos. Paradoxalmente, as semanas tem passado muito rápido: nem bem começa a segunda-feira e já estamos pensando na sexta, que chega com velocidade impressionante.
Nessas horas, lembro-me daquele monte de livro sobre gerenciamento de tempo que existe por aí. Parecem interessantes, sérios e com base científica. Acho que poderiam ser de grande ajuda para gente confusa e afobada como eu.
A verdade, porém, é que não tenho tempo para lê-los.
Boa semana!
Postado por Bia às 10:26 3 tartareaders
segunda-feira, 31 de março de 2008
Conversa de elevador
Elevadores, restaurantes pequenos, filas (de banco, de cinema), entre outras banalidades cotidianas, são sempre uma ótima fonte de sabedoria popular. Hoje, voltando do almoço:
“Ah, mas eu, quando tiver assim, uns dois anos de formada, já quero estar ganhando assim, tipo, uns 15 mil reais.”
Fiquei pensando que tipo de carreira ensejaria salário tão alto para um recém-formado. Cientista de foguetes? Não, no Brasil só temos a base de Alcântara, no Maranhão, e não acho que paguem tão bem assim. Talvez a moça estivesse cursando uma faculdade secreta, por exemplo, um curso de graduação modulada de Como-se-tornar-Bill-Gates-em-três-semestres ou um MBA em Criação de Programas Dominicais Infames para Auditório Idem. Em poucos segundos, o esclarecimento:
“Nossa, amiga, mas você não quer mais nada, não?”
“Ué, foi por isso que escolhi publicidade, propaganda, marketing, essas coisas. Dá mó grana.”
Continuei de costas, olhando para o vazio prateado das portas do elevador. Imaginava se, ao deixar o Direito e me tornar revisora e preparadora de textos, eu teria escolhido a profissão errada (de novo) ou se o mundo tinha pirado de vez. Não consegui chegar a uma conclusão antes de as portas se abrirem. Entrei no escritório, sentei à minha mesa e, ao lado de Aurélio, Celso Luft e Eduardo Martins, fui distribuindo vírgulas, maiúsculas e carimbos de revisão.
Outro dia, descendo a ladeira da Rua Augusta:
“Sabe, véio, de mulher, assim, eu não tenho preferência. Meu gosto é beleza internacional.”
O que seria essa tal de “beleza internacional”? Será que a eleita tem de ter olhos japoneses, cabelos escandinavos, peitos americanos e bunda brasileira? Ou boca francesa que faz biquinho, nariz tailandês e pernas italianas? Apertei o passo e desisti de entender o gosto daquele freguês. Eu, com bunda africana, barriga alemã, estatura pigméia, nariz grego e cabelo português.
Mas, ouvir a conversa dos outros não é falta de educação? Não sei. O que sei é que desde criança percebia quando minha mãe ou meu tio Dante, de repente, alheios à conversa, inclinavam levemente a cabeça para o lado e todo o corpo parecia pender em direção à mesa vizinha. Em poucos instantes, um sorriso gaiato surgia no canto da boca e eu sabia que eles tinham escutado alguma pérola.
Certa feita, esperava minha vez para almoçar no restaurante anos 50 da Vila Madalena. Balcão apinhado, sentei-me para tomar um Bloody Mary e vi, lá na outra ponta, um balde de gelo com uma garrafa de champanhe. “Ora, ora”, pensei, “tem alguém comemorando.” Mais tarde, quando já estava sentada, o balde com a garrafa estava na mesa ao lado. O rapaz, de um ineditismo invejável, pediu um strogonoff para acompanhar as borbulhas. A moça, um picadinho e uma água com gás. Não demorou para que a ouvíssemos dizer “mas você não entende, a gente quer coisas muito diferentes, não dá mais”. Não pude evitar sentir pena do rapaz. Embora tenha se esmerado, com champanhe e tudo o mais, a tentativa de reatar o casamento não prosperou. Como diria minha avó, gastou vela boa com defunto ruim.
Observar o que acontece ao nosso redor é uma arte, que o diga Nelson Rodrigues.
Postado por Bia às 16:11 5 tartareaders
sábado, 23 de fevereiro de 2008
O carapuceiro
Inspiradíssimo, como sempre, Xico Sá coloca um sorriso no meu rosto e muitas idéias na minha cabeça com dois textos publicados aqui.
Será que só eu acho que ele é o máximo?
Postado por Bia às 11:26 4 tartareaders
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quinta-feira, 20 de dezembro de 2007
Da fidelidade
(A imagem que ilustra este post foi retirada do blog Escritório de criação)
Leio o seguinte trecho de Humano, demasiado humano, do Nietzsche, inserto em O amor: receitas práticas e sábias, coletânea de textos filosóficos sobre o mais buscado dos sentimentos, editada pela Landy:
É possível prometer atos, não sentimentos. A promessa de amar sempre alguém significa portanto: pelo tempo que te amar, eu o testemunharei a ti por atos de amor; se eu deixar de te amar, nem por isso deixarás de ser da minha parte o objeto dos mesmos atos.
Lembrei de um conto de Machado de Assis recém estudado na pós-graduação, intitulado “Noite de almirante”. Conta a história de Deolindo Venta-Grande, marujo que sonha reencontrar Genoveva, com quem namorou durante três meses, pouco antes de sair em viagem. Naquela ocasião, a caboclinha lhe jurara fidelidade e, agora, dez meses depois, Deolindo vai ao seu encontro. Qual não é sua surpresa quando chega à casa de Genoveva e a encontra amasiada com um mascate. Incrédulo, indaga sobre o juramento que ela fizera. A resposta:
- Pois, sim, Deolindo, era verdade. Quando jurei era verdade. Tanto era verdade que eu queria fugir com você para o sertão. Só Deus sabe se era verdade! Mas vieram outras cousas... Veio este moço e eu comecei a gostar dele...
Genoveva é o símbolo da quebra do amor romântico, tão exaltado e descrito inúmeras vezes pelos autores que precederam Machado, por exemplo José de Alencar e Joaquim Manuel de Macedo, como o único tipo de amor possível. O amor que é eterno, que tudo vence e tudo supera. Machado, ao contrário, narra a história de um amor que sucumbiu ao tempo, à ausência, aos atrativos do mascate que arrebatou o coração de Genoveva. O mesmo texto de Nietzsche, citado anteriormente, ratifica o pensamento realista da moça:
Quem promete ao outro amá-lo sempre ou odiá-lo sempre ou de ser-lhe fiel sempre promete algo que não está em seu poder.
E foi isso que aconteceu: Genoveva, “sem saber como, amanhecera gostando dele”, do outro. Em seu juízo, nada fizera de errado. A ler-se o fragmento abaixo, retirado do Tratado da natureza humana, de Hume, conclui-se que ela apenas aceitou seu destino natural:
Por que meios persuadir os homens de que as transgressões do dever conjugal são mais infames do que qualquer outro tipo de injustiça, quando é evidente que elas são mais desculpáveis devido à importância da tentação? E que possibilidade há de suscitar repugnância às proximidades de um prazer pelo qual a natureza nos inspirou um pendor tão forte, e um pendor ao qual é, no final das contas, de todo necessário ceder para a preservação da espécie?
Ceder ao pendor natural, ceder à tentação. Já dizia Oscar Wilde: “I can resist everything except temptation.” Ao que parece, essa é, realmente, a sorte do ser humano.
A mim, parece-me que é Vinícius de Moraes quem dá a última palavra sobre o assunto:
Soneto da fidelidade
De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Quem não seja imortal posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
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quinta-feira, 29 de novembro de 2007
Comichão
Ontem de manhã, eu estava na sala de espera de um laboratório. Em volta, mulheres e mais mulheres esperavam ser chamadas, assistindo Ana Maria Braga na enorme televisão pendurada na parede.
Olhei em torno e a única revista disponível era, pasmem, a Homem Vogue. Refeita do susto de encontrar uma publicação destinada a um descolado público masculino em uma sala de espera lotada de mulheres, apanhei a revista e comecei a folheá-la. E foi então que eu o vi. Ou melhor, li.
Xico Sá, para quem morou em Vênus até a semana passada, é jornalista (escreve para a Folha e a Trip, por exemplo), tem um blog ótimo e é macho. Não, ele não é só simplesmente um indivíduo do sexo masculino. Ele é advogado de causa do macho, pregador exultante das maravilhosas diferenças entre o homem e a mulher, militante incansável da idolatria às mulheres. Ele é o autor de Modos de macho & modinhas de fêmea e Catecismos de devoções, intimidades & pornografias. Galanteios, lisonjas, elogios: as palavras de Xico são o que há de sexy nessa vida.
Devo confessar que o texto que eu li no magazine da sala de espera do laboratório despertou em mim uma comichãozinha. Ali, naquele lugar insólito e insípido, eu me perdi em fantasias provocadas pelas palavras do Xico. Não sei quantas vezes chamaram meu nome antes que eu acordasse dos meus devaneios com um sorriso no rosto.
Divido essa experiência com vocês:
DA ARTE DE PEDIR
Uma das maiores virtudes de uma fêmea é arte de pedir.
Como elas pedem gostoso.
Como elas são boas nisso.
Resistir, quem há de?
Um simples “posso pegar essa cadeira, moço?” vira um épico. É o jeito de pedir, o ritmo da interrogação, a certeza de um “sim” estampado na covinha do sorriso.
Pede que eu dou.
Pede todas as jóias da Tiffany’s, minha bonequinha de luxo!
Estou pedindo: pede!
Eu imploro, eu lhe peço todos os seus pedidos mais difíceis.
Pede a bolsa de cerejas da Louis Vuiton, pede o shopping inteiro, pede a Daslu.
Pede que compro nem que seja no camelô.
Não me pede nada simples, faz favor.
Já que vai pedir, que peça alto. Você merece.
Como é lindo uma mulher pedindo o impossível, o que não está ao alcance, o que não está dentro das nossas posses.
Podemos não ter onde cair morto, mas damos um jeito, um truque, um cheque sem fundos.
Até aqueles pedidos silenciosos, quando amarra a fitinha do Senhor do Bonfim ou de Nossa Senhora do Carmo no braço, são lindamente barulhentos.
Homem que é homem vira o gênio da lâmpada diante de uma mulher que pede o impossível.
Ah, quero o batom vermelho dos teus pedidos mais obscenos.
Quero o gloss renovado de todas as vezes que me pede para fazer um pedido, assim, quase sussurrando no ouvido: “Amor, posso te pedir uma coisa? Posso mesmo?”
Um castelo na Inglaterra?
Sim, eu dou na hora.
Sim, eu opero o milagre.
Como no pára-choque, o que você pede chorando que não faço sorrindo?!
Pede, benzinho, pede tudo.
Que eu largue a boemia, pare de beber e me regenere???
Pede, minha nega, que o amor tudo pode.
Mesmo as que têm mais poder de posse que todos nós não escapa de um belo pedido.
Com estas, as mais poderosas, tem ainda mais graça. Elas pedem só por esporte, o que não lhes compromete a pose e muito menos a independência.
Não é questão de poder ou dinheiro.
O charme e o que importa é o pedido em si, o romantismo que há guardado no ato.
Os melhores cremes da Lancôme? Vou a Paris agora. Estou pronto.
Eu lhe peço: me pede.
Não pede mimos baratos, pede atenção, por exemplo, essa mercadoria tão cara ao mundo das moças. Pede, sou o senhor de todas as tuas demandas.
Esse texto foi publicado originalmente aqui. Como eu não sabia se podia reproduzi-lo, pedi permissão ao Xico. Olha o que ele respondeu (29/11/07, 8h49):
ô querida, pode publicar sim o texto. nao somente este, mas qualquer um outro de minha autoria é de livre circulação. pode republicar sem pedir permissão.
beijo,pendurei o teu blog aqui nos meus favoritos.
xico sa
Fofo.
***
Atualização (19/12/2007): Fui ao lançamento do último livro do Xico, Caballeros solitários rumo ao sol poente, na Livraria da Vila, no último dia 12. Xico, galante como sempre, abriu um sorriso gostoso quando me apresentei e fez essa dedicatória:
Para Bia, que chegou linda e com vestido idem! Beijo, Xico Sá
Fofo, de novo.
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segunda-feira, 5 de março de 2007
Uma Ode à Segunda-feira
Segunda-feira de manhã é o momento utópico da semana que se inicia. Nesse momento, as alegrias, diversões e descansos gozados durante o Sábado e o Domingo ainda povoam a mente e a noite bem dormida, fruto da ausência de preocupações, fortalece o corpo para a série de atividades a serem desempenhadas durante a semana.
É então, neste exato momento, que se pensa: tudo é possível porque eu posso tudo. É na Segunda-feira de manhã que cada um se torna membro da Liga da Justiça, super-herói cotidiano capaz de cumprir com todas as suas tarefas e ainda salvar o mundo no fim do dia.
Deitado na sua cama, o sujeito planeja a semana. Decide levar o relógio, o liquidificador, o vídeo cassete para o conserto. Ninguém mais usa vídeo cassete, mas ele vai levar o aparelho até a assistência técnica mesmo assim, porque decidiu não deixar mais nada quebrado dentro de casa.
Resolve que vai realmente se alimentar melhor essa semana. Olha, se comer apenas um bife com salada de tomates na hora do almoço, está ótimo. E suco, sim, suco, nada de refrigerante. Cerveja, nem pensar.
Vai se informar sobre aquelas aulas de inglês, tae kwon do, oratória, desenho livre, precisa ter outra atividade além do trabalho, senão acaba estressado, irritado com todo mundo. Decide exercitar o lado direito (ou será o esquerdo?) do cérebro, tem que pensar na velhice. Envelhecer é uma arte, todo mundo sabe disso.
Então, o sujeito se levanta, toma banho, toma café da manhã (já então começa a cuidar melhor do que come), se veste e vai para o trabalho. Sente-se bem, revigorado, de novo de posse das rédeas da sua existência.
Na Sexta-feira à tarde, o vídeo cassete continua quebrado; ninguém usa mesmo, para que gastar dinheiro com isso. Comeu o bife, a salada de tomates e mais hamburger, pizza, torta de frango e macarrão, fora os três pães de queijo na hora do almoço de quinta-feira porque não teve tempo nem de sair da mesa para almoçar. O chope (chopes, mais de um, certamente) no happy hour de quarta-feira, isso não conta, era a despedida da secretária júnior de um dos sócios adjuntos do departamento comercial de uma empresa coligada, ocasião especial. Tampouco fez tae kwon do ou desenho livre, quem é que tem tempo para isso?
Cinco dias depois, aquele momento utópico de total controle dos seus atos e horários parece longínquo e confunde-se em uma bruma de sensações em que predomina a vontade de que a semana acabe e nasça o Sábado.
Envelhecer é horrível, todo mundo sabe disso. Mas não fica pior ainda quando o tempo tanto escorre lentamente qual areia em ampulheta ou nos atropela fosse vento de verão?
Na próxima Segunda-feira, começa nova semana. É chegado o tempo de a utopia dar lugar à ação.
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domingo, 7 de janeiro de 2007
I got a glimpse on how it is being single this days and I don't like it.
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terça-feira, 26 de dezembro de 2006
Nenhum homem é uma ilha
O aquecimento global, que vem causando um aumento no nível dos oceanos, fez sua primeira vítima. Lohachara sucumbiu, submersa por águas caudalosas sem precedentes.
Daqui cem anos, quando outras ilhas já tiverem desaparecido e a condição ambiental do planeta estiver ainda mais precária, a imprensa lembrará Lohachara. Somos testemunhas de um marco histórico.
Tal qual Forrest Gump, passamos pela História fazendo a nossa história. Resta apenas que mantenhamos nossos olhos bem abertos para conseguir perceber o momento em que nossos marcos pessoais acontecem.
Postado por Bia às 17:39 10 tartareaders
sexta-feira, 8 de dezembro de 2006
Cada dia é uma incógnita
Acordamos todos os dias sem saber o que nos espera, sem ter idéia do que acontecerá nas próximas horas.
Os mais céticos podem dizer que sabem, sim: que levantam da cama, tomam café da manhã, se banham e se arrumam para ir ao trabalho, à escola, faculdade ou qualquer outra atividade que tenham programado. Que o dia vai passar e que retornarão às suas casas no final da tarde para o jantar, e depois ver um filme, assistir a novela, transar com a esposa ou qualquer outra coisa assim.
Mas a verdade é que há certas coisas que atropelam o nosso dia e, para isso, não há programação que resista.
Você, esposa insipiente ou marido infiel, talvez hoje seja o dia em que tudo será posto às claras, que o consorte traidor será flagrado e o seu casamento se revelará uma farsa.
Você, funcionário dedicado que trabalha faz 20 anos no mesmo setor da mesma empresa com as mesmas pessoas, talvez seja hoje o dia em que você conhecerá o seu substituto, 20 anos mais novo e 20 vezes mais enérgico do que você.
Você, desavisado, talvez hoje seja o dia em que uma bicicleta o atropelará e você terá que ficar uma semana com a perna engessada assistindo “Sessão da Tarde”.
Ou talvez seja hoje que aquela sua amiga dos tempos de colégio, que sofre muito por causa de alguns demônios pessoais... talvez seja hoje que ela não consiga sair de dentro do casulo, que ela não consiga mais completar o ciclo.
Ou não.
Talvez seja hoje que você descubra que tem o casamento mais feliz de todos, que o seu marido te leve para jantar embaixo de uma figueira, que sua esposa compre uma nova lingerie, que a promoção com que você sonha há 20 anos aconteça, que o ciclista seja uma pessoa maravilhosa e você ganhe um amigo, quem sabe um namorado.
E que mais uma vez a metamorfose aconteça e que sua amiga ressurja, mais uma vez, como uma linda e colorida borboleta.
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sexta-feira, 24 de novembro de 2006
Abaixo a mesquinhez
Vou tentar falar sobre um assunto um pouco complicado de explicar e polêmico para entender.
Seu Aurélio define mesquinhez como insignificância, pequenez, miudeza, sovinice, avareza, desdita, infelicidade. Eu defino mesquinhez como pobreza de espírito e egoísmo, que pra mim são dos maiores defeitos que o ser humano pode ter.
Gente, ser egoísta não é comer um bolo de chocolate inteiro e não deixar nada pra ninguém, não é querer ficar em casa e assistir AXN até de madrugada, não é deixar o par constante em casa para ir a algum lugar sozinho. Isso é ter personalidade, é saber o que se quer e fazê-lo.
Egoísta é aquele que não dá passagem no trânsito, mesquinho é aquele que buzina em vez de contar até 5 (até 5, não precisa ser até 10!) e esperar o tráfico fluir numa boa. Egoísta é aquele que, quando você diz: "Tive um sonho tão legal...", ele diz: "Nossa, eu também!" e começa a contar o dele, se esquecendo de perguntar sobre o seu. Vocês sabem do que eu estou falando.
O que eu quero dizer é: todo mundo tem defeitos e problemas e eu acho, sinceramente, que cada um tem que pensar primeiro nos seus problemas para depois tentar ajudar os outros.
Postado por Bia às 22:55 0 tartareaders
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segunda-feira, 28 de agosto de 2006
Wonder Woman
Postado por Bia às 14:38 0 tartareaders