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sexta-feira, 13 de junho de 2008

Para quem não gosta de ler (2)

Continuando o post abaixo (reparem como sou incapaz de falar de um assunto sem abrir parênteses, colchetes, chaves, posts e tudo o mais que o surrealismo me permitir, para criar conversas paralelas e associações que só fazem sentido na minha cabecinha atrapalhada - olha o tamanho do texto desses parênteses!, tsc, tsc, tsc, sou um caso perdido mesmo...), penso que todo mundo é um leitor em potencial. Basta descobrir o que se quer ler.

Por exemplo, suponhamos um estudante de Direito, nos primórdios da faculdade. Recomendar-lhe-ia que lesse alguns thrillers jurídicos, como os escritos por John Grisham e Scott Turow, ou algo como A Ira dos Anjos, de Sidney Sheldon. E, eu sei, estou me repetindo porque já falei de ambos antes. Mas o que esse estudante quer é vislumbrar os contornos que a vida profissional dele pode adquirir, ainda que fictícios.

Tomemos, então, uma adolescente de 15 anos. Imagino que o maior problemas delas ainda sejam as notas baixas, os meninos e a mãe. Que coisa melhor, então, do que ler O Diário da Princesa, a série inteira, e ficar imaginando que, na verdade, você não é filha dos seus pais e que, a qualquer momento, um mordomo de luvas brancas virá te resgatar dessa vida insuportável (sim, porque, na adolescência, tudo é hiperbólico) e revelar que você é a herdeira de uma pequena fortuna? E se estivermos falando de um garoto de 13 anos, vocês acham que ele não preferiria ser o Artemis Fowl, de Eoin Colfer, ou o Alex Rider, de Anthony Horowitz, dois mini-James Bonds do terceiro milênio? Eu sei que eu gostaria. Ou Capitães da Areia; sempre achei a marginalidade bastante atraente.

O aprendiz de leitor poderia ser, talvez, um rapaz de quase 30 anos, de origem humilde e sem muita instrução, mas que realmente se esforça para estudar e tentar uma carreira. Nesse caso, talvez eu recomendasse histórias da literatura brasileira que mostrassem os sentimentos da forma mais crua possível, que retrate a dificuldade que ele experimenta todos os dias. Algo como São Bernardo, de Graciliano Ramos, ou O Matador, de Patrícia Melo. Histórias com linguagem simples e que fazem com que o leitor médio se identifique com o enredo. Para esse rapaz, Cabeça a prêmio, de Marçal Aquino, então, é essencial.

E para uma dona de casa, de meia-idade, o que eu recomendaria? Talvez Quando Éramos Adultos, de Anne Tyler, ou Um Eco Muito Distante, de Muriel Sparks, ou Laços de Sangue, de Michael Cunningham, livros sobre família, tema tão querido quanto polêmico.

Para mulheres em busca de inspiração, Mulheres de Olhos Grandes, de Angeles Mastretta, ou A Casa das Sete Irmãs, de Elle Eggels. Histórias para pensar, lembrar e fazer ecoar.

Para homens em busca de inspiração, Nem Só de Caviar Vive o Homem, de J.M. Simmel, ou Caim e Abel, de Jeffrey Archer, pedras fundamentais da minha família.

Para adúlteros, Inimigos – Uma História de Amor, de Isaac Bashevis Singer, ou O Livro dos Ciúmes, de Carlos Trigueiro.

Para quem tem doença grave na família, e quer entendê-la, O Lugar Escuro, de Heloísa Seixas, Depois Daquela Viagem, de Valéria Piassa Polizzi, ou os contos, inéditos no Brasil, de Pretending the Bed is a Raft, de Nanci Kincaid.

Para quem tem doença grave na família, e quer afugentá-la, a fantasia da Trilogia do Universo, de Philip Pullman, ou Deuses Americanos, de Neil Gaiman, convidado da Flip.

Há, lógico, as dicas unânimes como, por exemplo, começar lendo contos ou crônicas, porque são mais fáceis, com as quais não concordo. Contos de Machado de Assis, como "Noite de Almirante", são repletos de significados que têm de ser entendidos. Crônicas? É um bom começo, sim, mas não queira debutar nos escritos de Nelson Rodrigues, o maior cronista do urbanismo carioca do século passado. Nelson não tem nada a ver com a fama que lhe impõe e deve ser levado muitíssimo a sério.

Dicas certeiras, como flores na véspera de Santo Antônio, são nomes como Isabel Allende, Agatha Christie, Conan Doyle e Luís Fernando Veríssimo, por exemplo, excelentes contadores de histórias. Mario Prata, cronista hilário do Estadão, também vale. Ruy Castro, com seus livros agradabilíssimos de ler, tanto pelo tema quanto pela habilidade narrativa, também é sério candidato.

A verdade é que não acredito em quem diz que não gosta de ler. Acredito que essa pessoa ainda não encontrou o livro que diz o que ela quer sentir.

Mas ele existe. Basta procurar.

Um comentário:

Anônimo disse...

Sensacional esta idéia que você desmembrou em duas postagens, Turtle! Fiquei em êxtase e vou pegar papel e caneta para a devida procura. Que trabalho complexo você teve, a fim de dizer: este é para o adúltero, aquele para o corno; este para quem tem doente em casa e quer entender, aquele para quem deseje afugentar; este é para a mulher/o homem buscar inspiração; essoutro para isso, aqueloutro para aquilo, e assim sucessivamente, de maneira didática e gostosa, mas, acima de tudo, amorosa. Quem educa com amor exsuda esse amor pela forma como educa.
Entre os beneficiados pelo seu trabalho alinho-me, e muito lhe agradeço!
Simão