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quarta-feira, 25 de junho de 2008

Como ler um livro

Hoje em dia, em que nossa existência virtual rivaliza com a real, ler um livro pode ser considerado démodé, algo como as polainas de lurex dos anos 1970 (à la Julia Matos de Dancing Days), as carteiras OP com velcro e cores chocantes (para usar uma gíria da época) dos anos 1980 ou as calças baggy dos anos 1990 (não sei que moda foi essa, mas ainda bem que passou!).

Assim, é natural, se não fosse tragicômico, que existam manuais que ensinem as pessoas a ler livros. Em tempos de Orkut, Facebook, MySpace, Skype e outras modernidades quejandas, instruções de como usar esse objeto arcaico parecem necessárias.

Há, por exemplo, How to Read a Book (1940), o clássico de Mortimer Adler, que define regras para ler o chamado “cânone ocidental”, as grandes obras necessárias para a formação do pensamento inteligente, liberal e racional.

Adler analisa os tipos de conhecimento que podem ser adquiridos em livros, a forma com que o leitor apreende esse conhecimento e as modalidades de leitura que pode fazer. Segundo o professor, pode-se analisar a estrutura do texto, os argumentos usados para construir a tese do autor, mas é importante formarmos uma opinião crítica acerca do que lemos.


Enquanto Adler se detém em livros de não-ficção, Francine Prose se debruça sobre as obras literárias em Para Ler Como um Escritor (Reading Like a Writer, 2006), na minha cabeceira atualmente. A autora recomenda que o leitor preste atenção a cada detalhe do texto, desde a escolha das palavras até a construção do personagem, que leia nas entrelinhas o que realmente os grandes escritores quiseram dizer.

Uma das técnicas de que mais gosto é a de sublinhar palavras relacionadas a um determinado assunto importante para o enredo. O exemplo que Francine dá é o de um trabalho de escola que ela teve de fazer quando jovem. O professor de Literatura pediu que durante a leitura de Rei Lear, de Shakespeare, e, se não me engano, Édipo, de Sófocles, os alunos destacassem todas as palavras relacionadas ao tema da cegueira. Assim, seria possível comparar de que forma os dois autores constroem os personagens e suas características.

A idéia é excelente, na minha humilde opinião.

3 comentários:

Anônimo disse...

São técnicas interessantes, sem dúvida alguma, Bia; entretanto, como regras, comportam exceções. Se pensarmos sob a ótica do "vel" de Lacan, o objeto cognoscível e o ser cognoscente podem entremear-se num misto de não conexão (quando a inclusão era desejada), e aquele que lê apenas lê-se, nas linhas que estão escritas apenas como símbolos indecifráveis dentro de um ego obliterado e referto apenas de si mesmo.
Se é possível (pensando em Totem e Tabu, de Freud) fazermos o outro de totem, por que não uma obra?
Às vezes, uma frase do livro pode servir, na linguagem lacaniana, como ponte de afânise para o não-entender. A fantasia básica, elementar, não é um dos quatro elementos-chaves da psicanálise.
Horkheimer e Adorno tentaram com menos êxito que Lacan unir Sade e - ninguém menos que - Kant!, e não é que as premissas de ambos são muito similares, mas a forma de vê-las (eis aí o "vel" da interpretação) é completamente outra, donde chegarem a conclusões díspares, senão antípodas? (parece ironia, mas moralidade e imoralidade exsurgem dum só mergulho ideológico, se se muda a premissa menor. Sem sofismas...
Tanto posso fazer de um livro, como de uma outra pessoa, um prolongamento de mim mesmo. Totemizá-lo ou totemizá-la.
E por que digo tudo isso? Em primeiro lugar, porque seu blog suscita discussões interessantíssimas, sempre; em segundo, porque eu queria que o tempo não passasse, e que amanhã não fosse amanhã, e o tempo parasse hoje. Eu queria não precisar dizer sim nem não, simplesmente porque não há o que dizer, se nem há o que pensar. Eu queria não precisar passar por determinadas provações. Quem me dera poder ser esquecido, pela eternidade. Queria o direito de, como Caim, fugir para algum lugar e começar uma nova vida. Não quero totem, não quero tabu, quero apenas silêncio. Eterno silêncio. Como diz Clarice, quero ao menos que, se for imprescindível escrever, não esmaguem, tais palavras, as minhas entrelinhas.
Se eu pudesse, seguraria o ponteiro do relógio hoje, para que ele não se movesse nunca mais.
Amplexos, amiga!
Simão Cireneu

Jether disse...

Adler se detém em livros de não-ficção
Você não deve conhecer a última edição do livro, pra dizer isso...

Jether disse...

Em tempos de Orkut, Facebook, MySpace, Skype e outras modernidades quejandas, instruções de como usar esse objeto arcaico parecem necessárias.
Ah, outra coisa, ele ensina a ler todo tipo de matéria de leitura: jornais, revistas, panfletos, Orkut, Facebook, MSN, blogs etc, não somente livros.